Por que o crescimento evangélico desacelerou no Brasil?

Os dados sobre as religiões do Censo 2022, divulgados nesta sexta-feira, 6 de junho, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revelam que a proporção de evangélicos na população brasileira continua crescendo, mas o ritmo desacelerou pela primeira vez em 62 anos. Os evangélicos já são mais de um quarto da população (26,9%). Em 2022, no entanto, o avanço foi de 5,2 pontos percentuais, abaixo dos 6,5 pontos percentuais registrados entre as medições de 2000 e 2010.

“Havia uma previsão de que os evangélicos iriam ultrapassar os católicos em 2032, mas esse resultado confirmou uma dinâmica de desaceleração e consolidação desse crescimento, o que já vínhamos observando”, diz Magali Cunha, pesquisadora do Instituto de Estudos da Religião (Iser). “A religião está misturada com a vida, com a cultura. Muitas vezes as projeções levam em conta apenas números e não observam essa dinâmica”, explica.

A pesquisadora aponta alguns fatores que podem explicar esse freio no ritmo do avanço evangélico. O primeiro deles é o próprio funcionamento do segmento evangélico, que é bastante fragmentado. “O trânsito dentro do campo evangélico é intenso, ou seja, não há uma vinculação tão fixa com determinada igreja, um apego a uma só comunidade, como era mais comum no passado. Isso cria uma fragilidade na vinculação”, explica.

Essa maior fragilidade na vinculação, que é mais forte em igrejas tradicionais, onde a quantidade de membros é mais fixa, pode levar a perda de fiéis, segundo a pesquisadora. Outro fator pode ser a frustração dos evangélicos com o excesso de política nas igrejas. “A forma como Bolsonaro foi lançado como candidato, com uma aliança muito forte com lideranças evangélicas, explicitou essa direita evangélica na política”, lembra.

Ela recorda que nas últimas eleições, desde 2018, a participação de candidatos em igrejas se tornou muito forte. “Cultos apresentando candidatos como escolhidos de Deus, demonizando outros. Antes isso acontecia de uma forma mais velada”, comenta. A pesquisadora também observa que a consolidação de uma direita evangélica é uma novidade dentro do campo social e que isso provocou uma insatisfação com o uso das igrejas para campanhas, mesmo entre evangélicos conservadores, o que pode ter gerado afastamentos.

“Isso tudo ainda precisa ser medido. Os dados do IBGE não trazem maiores detalhamentos. A pandemia, por exemplo, também pode ter sido um fator que leva a perda de membros nas igrejas, porque muitas pessoas passaram a acompanhar apenas os cultos online. Então ainda precisamos de um refinamento maior desses dados”, aponta.

Além do crescimento dos evangélicos, no Brasil, mais pessoas têm declarado que são de religiões de matriz africana, como umbanda e candomblé

Mosaico religioso está mais diverso, diz pesquisadora

Os novos dados do Censo 2022 mostram um Brasil mais plural do ponto de vista religioso, diz Magali Cunha. “Sempre houve essa ideia do Brasil como país católico, mas os dados mostram, com próprio crescimento evangélico e de outros segmentos, inclusive com uma pluralidade religiosa mais marcante no tocante às religiões de matriz africana, como a umbanda e o candomblé [que mais do que triplicaram, alcançando 1% – 1,8 milhão de pessoas]. Isso gera um mosaico religioso mais diverso”, diz.

Cunha acredita que a maior diversificação pode estar relacionada ao fato de que as pessoas podem estar falando mais abertamente sobre suas escolhas religiosas. “O Censo é uma autodeclaração. Antigamente as pessoas ficavam com medo, por exemplo, de dizer que eram da umbanda, do candomblé. As pessoas continuam sofrendo discriminação, mas essa maior autodeclaração pode ter mexido com os números”, observa. 

O segmento católico recuou de 65% em 2010 para 56,7% em 2022, seguindo uma tendência já observada desde a década de 40, segundo o Iser. São 100,2 milhões de católicos no país. A pesquisa também aponta um crescimento no número de brasileiros sem religião, que somaram 16,4 milhões.

Adicionar aos favoritos o Link permanente.