CEO, é com você mesmo!

O CEO que parou no tempo

Ele fundou a empresa. Ajudou os primeiros clientes pessoalmente. Formou uma equipe técnica sólida, cuidou da entrega, honrou compromissos — e a empresa cresceu. Mas, anos depois, ele ainda depende do mesmo canal de vendas de sempre: indicações espontâneas.

Se você é um CEO de uma empresa de TI com mais de uma década de estrada, é provável que essa história soe familiar. Você fez tudo certo do ponto de vista técnico, mas nunca estruturou uma operação comercial em torno de si. Até tentou contratar vendedores, entregou a “chave do comercial” para eles, mas não deu certo. E então desistiu.

Hoje, o mercado exige outro tipo de liderança. CEOs que seguem imersos na operação perdem espaço. E, junto com eles, a marca da empresa vai desaparecendo das conversas que realmente importam. O problema é que muitos nem sabem por onde começar essa virada — e seguem parados, esperando que a próxima indicação resolva tudo. Mas não vai resolver.

Talvez ainda haja tempo. Mas uma coisa é certa: o mercado não espera.

A negação: “Mas eu não sou vendedor”

Todo CEO, antes de iniciar sua jornada nas vendas, passa por um momento clássico: a recusa ao chamado. E com muitos, esse momento pode durar anos.

Formados na técnica, moldados pela entrega, eles carregam uma crença silenciosa — mas poderosa: “vender não é pra mim”. Pior: muitos ainda têm uma imagem distorcida do que é vender. Associam o vendedor à figura insistente, oportunista e até mesmo desonesta. E se afastam de tudo que se pareça com isso. Evitam a exposição. Rejeitam o microfone. Delegam a responsabilidade de gerar negócios para terceiros. E, aos poucos, deixam de ser relevantes para o mercado.

Mas o que eles não percebem é que o papel que precisam assumir não tem nada a ver com aquele estereótipo que rejeitam. Eles não precisam vender como um vendedor. Precisam liderar como quem entende o valor do que construiu — e tem clareza sobre para quem esse valor deve ser apresentado.

Enquanto muitos negam esse chamado, outros — até menos preparados, mas mais disponíveis — o aceitam. E ganham protagonismo. Aparecem em eventos, constroem reputação, geram confiança. Tornam-se o rosto da empresa, mesmo sem necessariamente serem os mais competentes. Eles vencem o jogo porque toparam estar onde os outros evitaram.

Recusar esse papel pode parecer humildade. Mas, no fundo, é um erro estratégico. E um erro caro. Todo mês em que o CEO se omite é um mês em que deixa dinheiro na mesa — e espaço para que outro ocupe o lugar que poderia ser seu.

Quando o tempo cobra seu preço

A estagnação raramente chega de forma brusca. Ela se instala devagar, silenciosa — e muitas vezes disfarçada de estabilidade. O pipeline até gira, mas sem previsibilidade. Um mês entra projeto e outro não. E o que parecia segurança vira ansiedade: quantos contratos teremos no próximo trimestre? Nenhum indicador responde com clareza.

Boa parte dos CEOs estagnados no mercado de TI percebe esse sintoma tarde demais. E, quando tentam reagir, adotam a saída mais comum — e mais frustrante: contratam um vendedor. Mas não estruturam uma estratégia. Não definem um posicionamento. Não criam um plano. Apenas delegam a função comercial esperando que alguém externo resolva o que deveria partir do comando.

Inevitavelmente, a experiência fracassa. Porque o problema não é a falta de vendedores — é a ausência de liderança comercial.

Depois de tentativas frustradas, muitos recuam. Voltam a operar com base em indicações, sorte, e ações pontuais. Mas o mercado continua girando. E nesse ritmo, quem não se move perde relevância. Ganha quem aparece. Ganha quem provoca conversas. Ganha quem constrói posicionamento com consistência.

A estagnação, portanto, não é apenas uma fase. É um alerta estrutural. Um sinal claro de que a empresa parou de evoluir comercialmente. E o custo disso vai além do faturamento: afeta a moral da equipe, dificulta a retenção de talentos e torna cada nova oportunidade mais difícil de conquistar.

O tempo cobra. E cobra caro.

De CEO técnico para CEO estratégico

A transformação que muitos CEOs evitam não exige trocar de empresa. Exige trocar de papel. É uma mudança de identidade dentro do próprio negócio — uma transição silenciosa, mas decisiva, sobre onde e como o fundador deve atuar a partir de agora.

Durante anos, esse CEO foi o pilar técnico da operação. Resolveu os problemas mais complexos, garantiu a entrega e apagou incêndios. E isso fez a empresa crescer. Mas o que trouxe até aqui não sustenta o próximo ciclo.

À medida que o mercado amadurece, ele exige outro tipo de liderança: uma liderança que aparece. Que cria pontes com o mercado. Que posiciona a empresa como parceira estratégica — e não apenas como fornecedora de soluções técnicas.

Esse salto não é sobre virar outra pessoa. É sobre aceitar que o negócio precisa de alguém que lidere o crescimento com clareza, visão e influência. Porque em vendas complexas, a decisão de compra passa por confiança. E confiança se constrói com presença e coerência — dois atributos que só o CEO pode entregar de forma legítima.

Deixar de ser o bombeiro da operação para se tornar o arquiteto da estratégia é desconfortável no início. Mas é exatamente essa mudança que libera a empresa para crescer com consistência.

O que muda quando o CEO assume o comercial

Quando o CEO assume a linha de frente comercial, a empresa ganha mais do que novos leads — ganha um novo lugar no mercado. A percepção externa muda. A autoridade se torna visível. E o nome da empresa começa a circular por mérito próprio, não apenas por memória ou indicação.

Por dentro, a mudança também é perceptível. A equipe passa a enxergar uma direção clara. O discurso se alinha à prática. As prioridades ficam mais evidentes. E mesmo quem não atua diretamente com vendas sente o impacto de uma liderança que olha para fora — e não só para dentro.

Na prática, o que muda?

As conversas com o mercado deixam de ser acidentais e passam a ser intencionais.

As oportunidades deixam de depender da sorte e passam a ser provocadas.

O posicionamento da empresa deixa de ser implícito e começa a ser reconhecido.

O CEO que assume essa frente deixa de ser apenas o “fundador da empresa” e se torna seu principal ativo estratégico. Ele não substitui uma equipe comercial — ele mostra, com o próprio exemplo, que vender é uma prioridade institucional. E ninguém sinaliza isso melhor do que o próprio líder.

Essa presença ativa transforma o comercial de um setor em busca de eficiência para uma frente real de crescimento. E é isso que muda o jogo.

O plano de transição

Reconhecer que precisa mudar é o primeiro passo. Mas muitos CEOs travam no segundo: como mudar? A ideia de “sair do operacional” é fácil de aceitar no discurso — mas difícil de aplicar na prática. E, sem um plano concreto, o risco é grande: ele começa a largar tarefas que domina, mas não sabe o que colocar no lugar. Como consequência, perde produtividade, confiança e, muitas vezes, volta para o mesmo ponto de antes.

O que falta não é motivação. É planejamento e método.

A transição de CEO técnico para CEO estratégico exige clareza em duas frentes: interna e externa.

Na frente interna, o caminho começa com um diagnóstico:

Onde exatamente o tempo está sendo gasto hoje?

Quais atividades realmente exigem a presença do CEO?

Quais podem ser automatizadas, delegadas ou simplesmente eliminadas?

Na frente externa, é hora de ocupar um novo espaço:

Agendar conversas semanais com pessoas-chave do mercado.

Criar e publicar conteúdo que reflita sua visão estratégica.

Estar presente em eventos que reúnem seus clientes ideais.

Tornar-se reconhecido pelas conversas que conduz, não apenas pelas soluções que entrega.

Para dar estrutura a esse movimento, proponho um ciclo de 90 dias de transição, dividido em três etapas:

Reduzir o envolvimento direto no operacional.

Reposicionar a rotina com ações de visibilidade e relacionamento.

Reforçar o novo papel com rituais que garantam consistência e presença no mercado.

Ao final desse ciclo, o CEO ainda é o mesmo — mas sua atuação não é mais. E a empresa, inevitavelmente, começa a mudar com ele.

Pare de se esconder

Nenhuma empresa cresce de forma consistente com um CEO trancado na operação. O tempo dos líderes invisíveis ficou para trás — e cada trimestre parado custa mais caro.

A boa notícia é que ainda dá tempo. Tempo de retomar as rédeas da estratégia. De aparecer para o mercado certo. De construir autoridade junto a quem realmente decide. Mas esse tempo tem prazo. E quem não se movimenta agora, vai assistir de fora enquanto concorrentes menos preparados ocupam o espaço que poderia ser seu.

A transição de CEO técnico para CEO estratégico não é um luxo nem um capricho. É um movimento de reposicionamento, influência e sobrevivência. Quem entende isso a tempo, larga na frente — porque passa a conduzir o jogo em vez de reagir a ele.

Como toda jornada importante, essa começa com uma escolha: seguir evitando o protagonismo ou finalmente ocupar o lugar que só o próprio CEO pode assumir.

O que vai ser para você?

*Por Marcelo Morem, fundador e diretor da Mextres.

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