Modelo Caroline Ribeiro se abre sobre a esclerose múltipla: ‘O baque vem’

Caroline Ribeiro marcou o mundo da moda. Já foi o rosto de grifes como Chanel, Louis Vuitton, Gucci, Valentino, Yves Saint Laurent, além de ter desfilado nas passarelas mais concorridas do mundo. Com uma carreira longeva em um mercado volátil, a paraense que começou a trabalhar com 14 anos, ainda é presença marcante nas semanas de moda e hoje, aos 45, também cobre tapetes vermelhos como do Oscar, Emmy, Globo de Ouro para a televisão. Carol, como é chamada por conhecidos, vive agora um capítulo ímpar em sua vida. Diagnosticada com esclerose múltipla no ano passado, ela divide com Marie Claire os percalços e descobertas dessa jornada.

O diagnóstico

No dia 10 de abril de 2024, quando o neurologista disse “esclerose múltipla”, a modelo perdeu o chão, mas ‘tentou se fazer de forte’. O profissional de saúde não deu a notícia de uma maneira otimista. “[O discurso] do médico não foi de: ‘vai dar certo, você vai conseguir, existem tratamentos muito modernos hoje em dia’. Confesso que saí de lá bem mexida, meio perdida, em choque e com medo. Será que meu futuro é depender de alguém, não levantar, não conseguir executar minhas funções de movimento? Passa tudo pela tua cabeça”, conta.

Quando chegou em casa, se desesperou. Foi para o Google e, entre relatos positivos e negativos, enxergou uma luz no fim do túnel. Com a ajuda da amiga, modelo e médica geriatra Ana Claudia Michels — a quem Carol se refere como “anjo”, com os olhos marejados — encontrou um neurologista clínico acolhedor e deu início ao tratamento.

O estigma da esclerose múltipla

A esclerose múltipla é uma doença crônica autoimune do sistema nervoso central. Ela se manifesta quando os anticorpos da pessoa atacam o prolongamento dos neurônios, responsáveis por conduzir os impulsos elétricos do sistema nervoso central para o corpo e vice-versa.

Quando isso acontece, aparecem sintomas de acordo com a área atacada. Entre os mais comuns estão: dormência em uma parte do corpo, alterações visuais, desequilíbrio, perda de força e dificuldade de controlar a bexiga ou o intestino — Carol praticamente gabaritou a lista. A condição acomete três mulheres para cada homem e, no Brasil, cerca de 40 mil indivíduos.

No imaginário coletivo, o pouco que se sabe sobre a doença é estigmatizante. Trata-se de um resquício de quando não havia tratamento. A pessoa, em geral jovem, sofria uma série de surtos e perdia funções progressivamente, até ficar acamada.

“Eu sabia pouco sobre esclerose múltipla, e o pouco que sabia não era bom. O nome assusta. Muita gente confunde com a esclerose lateral amiotrófica (ELA), que é totalmente diferente e bem mais delicada”, diz Carol.

O prognóstico começou a mudar em 1993, quando foi desenvolvido o primeiro remédio especificamente para a condição. Desde então, outros fármacos apareceram, oferecendo uma boa qualidade de vida para um quadro incurável.

O caminho até o diagnóstico

Carol começou a perceber os sintomas em agosto de 2023. Era um dia quente e ela estava correndo em Miami. Parou no meio da corrida porque não conseguia seguir. Era um cansaço estranho e uma sensação de que não dava para executar o movimento. Fazia um mês que se sentia estressada, com tontura, dor de cabeça forte e visão meio embaçada.

“No dia 17 de agosto, nunca vou esquecer, fiquei muito mal durante um trabalho. Chamei meu booker e disse que precisava de um tempo, ainda brinquei que não ia cobrar hora extra. Já tinha uns três dias que não dormia direito. E a partir daquele dia contei 17 dias sem dormir. Suava tanto que a roupa de cama ficava molhada, mesmo com o ar-condicionado em 17 graus. Falei pro meu marido que tinha algo muito estranho acontecendo comigo e pedi pra ele ficar de olho, e aí ele começou a me perceber também.”

No início, Carol suspeitou de síndrome do pânico, por conta do mal-estar, calor excessivo, fraqueza e fala enrolada. Ela chegou a receber a receita de Frontal (alprazolam, indicado para o tratamento de transtornos de ansiedade e insônia), mas a modelo preferiu não tomarPensou também que era menopausa. Foi ao ginecologista, mas os exames mostraram o contrário.

Depois, no endocrinologista, recebeu receita para remédios para tireoide. Mas a amiga Ana Claudia Michels, que estava terminando a especialização em geriatria, falou que, pelos exames, não tinha nada na tireoide. “A Ana foi o meu anjo. Tenho orgulho dela e até me emociono”, conta Carol.

Por sugestão de Ana, voltou ao ginecologista que reafirmou que não estava na menopausa e a encaminhou para um neurologista e um psiquiatra. “Fui ao neuro primeiro, e ele me disse para cancelar o psiquiatra por enquanto. Se tivesse ido ao psiquiatra antes, talvez estivesse tomando um remédio psicotrófico para síndrome do pânico. Fica o meu alerta também de investigar tudo antes de começar uma medicação mais forte”, alerta.

Até dia 22 de dezembro, a modelo fez tudo que o neurologista pediu: ressonâncias, exames de sangue, potencial evocado (mede a atividade elétrica do cérebro e da medula espinhal). Mas por conta da agenda apertada, retornaria ao consultório só três meses depois, já que tinha trabalho sem parar até o Oscar no ano seguinte.

“Cheguei a abrir os exames antes, vi que tinha algo errado, mas, pela primeira vez na vida, não pesquisei no Google. Busquei me acalmar para continuar trabalhando até março. Quando voltei ao médico, ele me diagnosticou com esclerose múltipla”, relembra. Carol fez em seguida só um exame do líquor para confirmar. “A partir daí, parei de brincar. No dia 10 de abril, tive a resposta definitiva.”

Carol deixou de se negligenciar. Criou um livrinho e passou a anotar tudo que sentia. Também buscou um médico mais especializado. “Ana Claudia me indicou o melhor neurologista de doenças neurodegenerativas. Ele foi uma luz no fim do túnel, porque é um médico de pesquisa, sempre aberto a entender as mudanças da medicina e o que está surgindo. Na consulta, me lembrei que em 2015 perdi o movimento do braço esquerdo, que teria sido meu primeiro surto”, conta.

O tratamento

Carol já fez duas aplicações com um remédio imunobiológico que reduz a imunidade, de modo que o organismo para de atacar a si próprio. “Antigamente, os imunossupressores tiravam toda a tua imunidade. Já o imunomodulador se concentra especificamente em dois ou três linfócitos para que você não fique totalmente exposta a outras doenças. Mas mesmo assim te afetam intensamente”, explica a modelo.

É um remédio forte, que custa 200 mil reais e tomo de seis em seis meses. Vou até uma clínica, fico lá por umas quatro a seis horas, como se fosse uma quimioterapia, e volto pra casa”, continua. O valor alto do medicamento assusta, mas Carol conseguiu pelo plano de saúde e conta que é possível também ter acesso pelo SUS. “Até o plano aprovar, foram dias de ansiedade nos quais precisei me controlar. Mas deu tudo certo. É possível conseguir o medicamento também pelo SUS, isso me deixou feliz.

Além disso, passou a fazer um tratamento hormonal para controlar sintomas que a incomodavam principalmente no ciclo menstrual e fez mudanças no estilo de vida. “O remédio bloqueia a progressão da doença, mas eu continuava com todos os sintomas, principalmente perto do ciclo menstrual. Tem pouquíssima informação sobre esclerose múltipla e ciclo menstrual, mas entendi que existe uma relação entre eles”, diz.

O hoje e o amanhã

Com tratamento em curso, Carol conta dos ajustes que tem feito na sua rotina. “Por causa da imunidade baixa, o médico me disse para usar máscara em ambientes muito lotados. Também não devo comer nada mal passado ou cru, nem produtos industrializados. A recomendação é seguir a dieta mediterrânea.

Além disso, tem investido em exercícios físicos de fortalecimento, equilíbrio e mobilidade. “A musculação entrou na minha vida e hoje realmente estou levando extremamente a sério. Antes, eu não tinha força para isso, sentia fraqueza 20 dias por mês, associado ao ciclo menstrual.” Outra mudança tem sido a terapia. “Comecei a fazer pela primeira vez, aos 45 anos.”

Agora, entende que é preciso saber escutar os limites do corpo. “A duras penas, aprendi que a gente não se percebe e não respeita os sinais do corpo. Depois do diagnóstico, entendi que, durante o ano de 2023, já estava sentindo os sintomas, mas não parei para me observar. Era como se meu corpo estivesse me dizendo: ‘Ah, não vai parar? Então, vou parar ele pra você.”

E deixa um recado para quem está vivendo um momento parecido: “O baque vem, é lógico, ninguém é mulher maravilha. A gente vai sentir o impacto, mas dá para respirar e entender que é possível seguir a vida. Não sou nada zen, mas estou tentando me tornar mais equilibrada. A doença me forçou a isso. E que bom, já que foi por aí que aprendi. Acho que a gente tem que tirar o melhor de cada experiência”.

 
 
 
 

 

Adicionar aos favoritos o Link permanente.