Head de políticas públicas do Whats dá no pé

Daniela da Silva Scapin, head de políticas públicas para o WhatsApp no Brasil, deixou a posição nesta sexta-feira, 7, em um protesto contra a “virada retórica” da Meta depois da eleição de Donald Trump para a presidência americana. 

“Uma corporação se alinhar política e economicamente a um governo poderoso recém-eleito não é novidade pra ninguém. Porém, a velocidade e a intensidade dessa virada retórica da Meta, e a adesão a uma base ideológica tão distinta dos valores que orientavam meu o trabalho até então, isso simplesmente não é algo que eu possa compreender, muito menos apoiar”, escreveu Scapin em um post no Linkedin.

Scapin não chega a entrar em detalhes, mas os fatos são conhecidos: pouco antes da posse de Trump o CEO da Meta, Mark Zuckerberg, veio a público para anunciar o fim da estratégia de moderação de conteúdo no Facebook e a adesão a um sistema mais parecido ao do X, baseado em “comunidades”.

Zuckerberg esteve presente em um lugar de destaque na posse de Trump, e junto com outros gigantes como Amazon e Google, encerrou políticas de “diversidade e inclusão” que não encaixam com a linha ideológica do novo governo. 

Até agora, as movimentações nos Estados Unidos pareciam não ter tido grandes impactos na equipe brasileira das multinacionais envolvidas, mas Scapin dá a entender que isso não deve seguir assim por muito tempo, pelo menos na Meta.  

“Aos agora antigos colegas, sei que esse anúncio vem num momento peculiar, já que em breve haverá mais mudanças e mais partidas na empresa”, aponta Scapin.

Scapin havia acabado de completar um ano de Meta. A profissional veio de quase 10 anos Open Society, uma ONG fundada pelo George Soros, bilionário americano que é um dos grandes inimigos do movimento conservador no qual as gigantes de tecnologia estão tentando achar seu lugar. 

A rota de colisão entre a Meta e as autoridades brasileiras já estava desenhada no próprio vídeo de Zuckerberg, no qual o CEO pede a ajuda de Trump para combater a “censura” na União Europeia, China, e, também no Brasil, apesar do país não ter sido mencionado diretamente.

“Países na América Latina tem tribunais secretos que podem ordenar empresas a tirar coisas da Internet discretamente”, disse Zuckerberg no vídeo, no que foi amplamente interpretado como uma menção indireta às polêmicas do Supremo Tribunal Federal do Brasil com o X, que acabaram levando a um bloqueio temporário da rede social de Elon Musk no país.

Como resposta, o Planalto articulou frentes de atuação no Legislativo e no Supremo Tribunal Federal (STF), que deram início ao julgamento de ações sobre a responsabilização das redes sociais.

A Meta e as demais grandes empresas de tecnologia deram a pista de qual deve ser a sua estratégia no dia 22 de janeiro, ao não dar as caras em uma audiência pública organizada pela Advocacia-Geral da União (AGU).

O debate promovido pela AGU buscava discutir a decisão da Meta de encerrar o programa de checagem de fatos em suas plataformas.

Na semana passada, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, deu mostras que o governo também pensa em pegar as empresas pelo bolso, propondo a chamada “regulamentação econômica das big techs”.

O que isso quer dizer na prática não está claro, porque o texto da proposta ainda está em elaboração pelo Ministério da Fazenda, ainda sem previsão de envio. 

A proposta deve trazer regras para o pagamento de impostos pelas empresas, e não é preciso ter muita imaginação para saber que o plano passa por arrecadar mais. 

Scapin tinha um cargo intermediário na maquinaria construída pela Meta e outras grandes empresas de tecnologia para fazer lobby (“políticas públicas” ou “relações governamentais”, no jargão das empresas) junto ao governo no Brasil.

É um tipo de profissional que normalmente não é tão experiente assim, e pode ficar muito exposto em situações de conflito, como se viu recentemente no caso do X, quando a especulação era que profissionais brasileiros podiam acabar na cadeia pelas bravatas de Elon Musk. Muitos optaram por sair fora antes disso. 

A pressão só deve aumentar nos próximos meses, na medida em que se aproximam as eleições de 2026 (basta imaginar um cenário no qual Trump apoia Bolsonaro abertamente para imaginar o quanto).

Adicionar aos favoritos o Link permanente.