Nuvem soberana: quase todo mundo dentro,

Os planos do governo federal para construir sua “nuvem soberana” tomaram novos rumos, que podem ser resumidos da seguinte forma: todo mundo está dentro, menos a Microsoft.

O Ministério da Gestão assinou acordos de cooperação técnica com a Dataprev e o Serpro, as duas maiores estatais federais de tecnologia, que vão operar a nuvem de diferentes multinacionais de dentro dos seus data centers. 

Até o momento, a Dataprev fez contratos com a Amazon Web Services (AWS), Huawei e Oracle. Já o Serpro também assinou com essas três empresas e com o Google (inclusive com uma certa dose de alerta).

De fora até o momento, por tanto, apenas a Microsoft, dona da Azure, nuvem que está entre as três maiores junto com a líder AWS e o Google Cloud (a Huawei e a Oracle correm muito por fora nesse mercado). 

A assinatura foi nesta terça-feira, 12, durante a 5ª Reunião da Comissão de Coordenação do Sistema de Administração de Recursos de Tecnologia da Informação, que envolve os cerca de 250 órgãos públicos e está prevista no Plano Brasileiro de Inteligência Artificial, com recursos de R$ 1 bilhão.

“A nuvem de governo ou nuvem soberana representa uma infraestrutura fundamental para a segurança e soberania digital do país. Ao concentrar dados governamentais e serviços nesta nuvem, gerida exclusivamente por órgãos públicos e empresas públicas, a nuvem de governo fortalece a proteção contra ameaças cibernéticas e assegura que informações sensíveis permaneçam sob controle nacional”, disse a ministra da Gestão, Esther Dweck.

O anúncio muda bastante o panorama que se tinha até agora da chamada “nuvem soberana”, com a qual o governo federal oferecer a partir dos seus data centers serviços com as mesmas características de um “hyperscaler”, como são conhecidas as empresas donas de data centers de alta performance.

Até agora, o Serpro vinha centralizando os anúncios em torno do assunto, começando em abril, quando a estatal divulgou o projeto da “Nuvem de Governo”, uma solução, que, de acordo com a estatal, transforma o Brasil “na única nação com nuvem 100% soberana no hemisfério Sul”.

Mais recentemente, no começo de outubro, representantes do Serpro foram a um grande evento do Google em São Paulo para anunciar que o Google Cloud seria fornecedora da “nuvem soberana”, através de uma oferta conhecida como Google Distributed Cloud (GDC).

A decisão chamou atenção desse repórter, porque todas as multinacionais de cloud tem alguma coisa parecida, destinada justamente a contornar a resistência de governos e clientes em mercados muito regulados. 

A Dataprev, por outro lado, vinha se mantendo mais discreta sobre o assunto, chegando a manifestar uma certa resistência ao termo “nuvem soberana”, que não deixa de ser uma espécie de oxímoro visto de um ponto da política de tecnologia mais ortodoxa da esquerda brasileira. 

UMA GRANDE DANÇA DAS CADEIRAS

Com o anúncio do Ministério da Gestão, parece ter chegado ao fim uma grande dança das cadeiras de fornecedores de tecnologia, todos andando em círculos ao som da música da política pública sobre nuvem do momento. 

Durante o governo Jair Bolsonaro, o Serpro começou a fechar acordos em série com as gigantes de nuvem, nos quais se posicionava como uma intermediária na venda de nuvem para órgãos de governo.

A AWS foi a primeira a entrar, com um contrato de R$ 71,2 milhões ainda em 2019. Depois vieram Huawei (R$ 23 milhões), Microsoft (R$ 22,6 milhões), Oracle (R$ 41,5 milhões) e IBM (R$ 40,3 milhões).

As condições eram sempre as mesmas: contratos de cinco anos, nos quais os valores fechados são apenas uma base, cuja concretização dependeria de quanto o Serpro fosse efetivamente vender no final.

Não se sabe efetivamente quantos contratos foram fechados por essa modalidade. Ainda no apagar das luzes do governo Bolsonaro, veio a público que o Ministério da Saúde fechou um contrato de R$ 32 milhões com o Serpro atuando como “broker”.

Curiosamente, a única grande empresa de computação em nuvem a não embarcar nos acordos com o Serpro na época foi o Google Cloud, agora o primeiro a se sentar na nova política de “nuvem soberana”.

Fica agora a dúvida se justamente a Microsoft, tradicionalmente uma grande fornecedora do governo federal, vai ser a empresa que vai ficar de pé, ou se ainda vai arrumar um espacinho.

GRANDES POSSIBILIDADES

Durante o anúncio em Brasília, surgiram novidades que mostram que a nuvem soberana pode ampliar muito a penetração da nuvem no governo brasileiro. 

Os 250 órgãos federais devem ser só o primeiro passo. Existe a possibilidade de estados e municípios fazerem adesão voluntária.

Isso se daria através de um “catálogo de serviços” do Centro de Serviços Compartilhados do Ministério da Gestão. 

Nesse catálogo, também estarão disponíveis para todos os órgãos as condições dos serviços que serão prestados, como o preço máximo da contratação e os níveis de serviços que serão prestados por Dataprev e Serpro.

O catálogo completo será divulgado no próximo mês.

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