Opinião: “Desafio Fiscal do Brasil: a realidade por trás do arcabouço e o efeito no mercado”

O equilíbrio fiscal virou o centro das atenções no Brasil. Com o governo prometendo Déficit Zero, a proposta de arcabouço fiscal foi apresentada como a solução para garantir essa meta ambiciosa. Mas a maneira como essa promessa está sendo conduzida tem deixado o mercado cético e desconfiado. Afinal, o arcabouço parece ter sido feito para “ganhar tempo” e evitar reformas mais estruturais. No fundo, ele ignora um objetivo básico de um país que quer se manter solvente: controlar o crescimento da dívida em relação ao PIB.

O mercado, que sabe muito bem das consequências de políticas econômicas inconsistentes, começa a reagir. Sem garantias de um superávit sólido, as metas de curto prazo e os anúncios de pacotes que parecem mais temporários do que efetivos geram insegurança. O cenário é de desconfiança, especialmente entre os investidores, e isso afeta a economia como um todo.

A credibilidade do Banco Central em jogo

Outro ponto sensível é a mudança nas metas de inflação. Recentemente, a meta contínua foi introduzida, mas será que isso resolve o problema ou complica ainda mais a comunicação com o mercado? Quando olhamos para o Banco Central, que deveria ser uma âncora de estabilidade, vemos uma pressão política constante para afrouxar metas e dar espaço ao crescimento de curto prazo. Não é de se surpreender que a credibilidade da instituição esteja em xeque. E, claro, o mercado não é facilmente enganado por palavras; ele precisa ver resultados.

Para piorar, vários dirigentes indicados pelo governo atual assumirão posições estratégicas no Banco Central. Isso levanta ainda mais dúvidas sobre a autonomia da instituição. Com o histórico de pressões e interferências políticas sobre a política monetária, será que podemos esperar que o Banco Central consiga seguir firme no seu papel de controlador da inflação? A interferência no seu trabalho seria uma ameaça não apenas à instituição, mas também à confiança dos empresários e investidores que esperam previsibilidade para seus negócios.

A armadilha do juro baixo e a política do “jeitinho fiscal”

O cenário atual não surgiu do nada. Durante a pandemia, o Brasil decidiu reduzir drasticamente a taxa Selic, nossa taxa básica de juros, como uma forma de estimular a economia. Mas o efeito foi passageiro.

Em agosto de 2022, a Selic foi elevada a 13,75% em resposta à necessidade urgente de controlar a inflação. Em setembro de 2023, o Banco Central iniciou um processo de redução gradual, levando a taxa a 10,5% em maio deste ano. No entanto, as expectativas de inflação e o cenário fiscal, que continuam descontrolados, forçaram o Banco Central a retomar o ciclo de alta, elevando a Selic para 11,25% hoje.

É importante reforçar que ninguém gosta ou quer juros altos – eles são um peso sobre a economia e sobre o bolso do consumidor. Mas é essencial entender que os juros elevados não são a causa do problema econômico atual, e sim uma consequência das políticas fiscais expansionistas. Em vez de uma política que sustente o equilíbrio das contas públicas, o governo opta por medidas que aumentam a dívida e pressionam a inflação, deixando para o Banco Central a difícil tarefa de usar os juros para tentar ancorar expectativas e dar alguma estabilidade à economia.

O pacote de corte de despesas: uma medida em suspenso

Há dias, o governo vem prometendo um pacote de corte de despesas para tentar viabilizar o Déficit Zero. Mas o anúncio ainda não aconteceu. O impasse é claro: apesar da insistência da equipe econômica em definir um valor e medidas específicas, o governo tem enfrentado pressões políticas que dificultam qualquer consenso sobre o que, de fato, cortar. O atraso e a falta de definição são preocupantes, pois revelam um ambiente onde os interesses políticos parecem estar se sobrepondo à responsabilidade fiscal.

Esse pacote de corte de despesas era aguardado com expectativa pelo mercado, mas a demora em anunciá-lo gera um clima de desconfiança. Sem um compromisso claro e com números que não saem do papel, o governo passa a impressão de que a disciplina fiscal não é, de fato, prioridade. Para um país com uma dívida em alta acelerada, um corte efetivo e estruturado nas despesas é crucial. Mas, enquanto o governo hesita, o mercado se questiona se essa meta de ajuste é mesmo alcançável.

Reforma orçamentária e vontade política: uma utopia necessária?

Uma reforma fiscal que enfrente os interesses de grupos privilegiados seria o caminho natural para corrigir as contas do país. Mas, no Brasil, isso parece uma utopia. Nossa máquina pública é inchada, nosso orçamento é engessado, e qualquer proposta de reforma orçamentária que ameace os privilégios de alguns grupos encontra resistência imediata. Os empresários e o mercado sabem disso, e é por isso que as promessas de ajuste fiscal não convencem.

É difícil imaginar que uma máquina pública tão onerosa e ineficiente possa ser mantida indefinidamente. Sem uma mudança estrutural e sem coragem política para enfrentar essa realidade, o Brasil continuará a depender de soluções paliativas e, muitas vezes, ineficazes. Para o setor privado e para os investidores, isso significa operar em um contexto de incertezas que dificulta qualquer planejamento de longo prazo.

O mercado financeiro e os empresários: reféns da política fiscal

A insegurança gerada pela condução política da economia torna o mercado financeiro e os empresários reféns dessa situação. Sem estabilidade e sem previsibilidade, quem tem interesse em investir ou expandir seus negócios no Brasil? E o impacto disso vai além das fronteiras: investidores estrangeiros, que buscam mercados emergentes, acabam desviando seus recursos para países com políticas mais estáveis e confiáveis. O custo dessa incerteza é alto, e não apenas para o mercado, mas para toda a economia brasileira, que perde competitividade e oportunidades de crescimento.

Uma economia à deriva?

A condução econômica atual do Brasil é um amontoado de promessas vazias e metas que parecem mais voltadas a ganhar tempo do que a resolver os problemas reais. O arcabouço fiscal, apesar de parecer um esforço no papel, está longe de ser suficiente para estancar o avanço da dívida pública. Com a credibilidade do Banco Central em jogo e uma política econômica de curto prazo, a economia brasileira parece estar à deriva, à espera de um ajuste real que ainda não veio.

Paula Moraes é âncora e fundadora da BM&C News

As opiniões transmitidas pelo colunista são de responsabilidade do autor e não refletem, necessariamente, a opinião da BM&C News

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